Sunday, December 13, 2009

Maternidade

Fui caminhando rápido na pressa de não chegar em casa. Na casa que não é meu lar, e morar fora do lar machuca. Mais um dia que eu não consegui sorrir integralmente. Foram sombras de alegria até que minha mãe me visse fora da minha jaula. Não me vira nu, como vim ao mundo, nem dilacerado como sou sob as vestes. Me vira com minhas mil máscaras tristes e incorretas, de fumar, beber, falar merda, com pessoas que ela não gosta antes de conhecer.

- Mãe, você está com raiva de mim?

- Não estou com raiva, estou magoada.

- Ah, sim – disse, saindo do quarto escuro onde ela remoía o que vira.

- Minha mágoa não te importa, então?

- Não é que não me importe, mas quanto à raiva eu poderia fazer algo. Quanto à mágoa, só posso sentir culpa.

E a culpa é um prelúdio que pede perdão incessantemente, é uma canção triste. Só podia resignar-me a sentir o que doía nela.

Ah, mãe, não me culpe por não precisar de você. E não culpe-se também. Mas eu cresci tanto que eu já não posso te necessitar, e nem o quero, como você não quis precisar de tua mãe. Esse egoísmo quase biológico é tão natural. Dá a continuidade à essa vida humana sem sentido.

E eu queria poder me perdoar. Eu peço perdão pelas coisas que já te disse, e esse pedido está nas coisas que nunca te disse, como o quanto eu te amo. Mas eu jamais precisara dizer que te amava. Você sempre soube, porque é assim que tem de ser, eu te amar e por ti ser amado. E como eu nunca questionei teus segredos, nem mesmo te questionei os meus segredos, me reservo o direito de manter meu sangue escorrendo lento e mudo. E sei que sua compaixão também é quieta, nos teus olhos severamente tristes. Assim, entrementes, vivemos.

Agora sossega em tua cama e volta ao sono do qual te arranquei. Não posso te devolver a vida e a liberdade que tinhas, pois a luz você me deu e agora não tem mais volta. Então padece, mãe, no teu paraíso, que eu tento ser feliz no meu inferno.

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